16 de janeiro de 2012

SOBRE O HINO DO COMERCIAL

A primeira notícia sobre a composição e execução do Hino do Comercial – o mais antigo hino entre os principais times de futebol no Brasil – remonta à edição do jornal A Cidade de 6 de junho de 1920 (mantendo-se aqui a grafia original):

Jardim Publico – A Banda “Independente”, em homenagem aos valorosos e bravos rapazes do “Commercial F.C.” executará hoje no coreto do Jardim Publico, o seguinte programma:
I Parte
Hymno do Commercial F.C., B. Pousa Godinho.
Aída, final do segundo ato, G. Verdi.
Viúva alegre, fantasia, Franz Lehar.
Sonho dourado, dueto, V. Georgio.
  II Parte
Trovador, Aria, G. Verdi.
Brasillianita, ouvertur, N.N.
Colloqui d’ Amore, Duetto, N.N.
Hymno do Commercial F. C., B. Pousa Godinho.

Portanto, a Banda Independente, sob a batuta do maestro José Delfino Machado (18?? – São Paulo, 1942), apresentava pela primeira vez no coreto (que não existe mais) do “Jardim Publico” (hoje Praça XV), o Hino do Comercial, autoria de Belmácio Pousa Godinho (Piracicaba, 1892 – Ribeirão Preto, 1980). O Hino do Comercial era estreado, portanto, sem letra, numa execução com versão para banda, abrindo e encerrando o concerto público que continha essencialmente trechos instrumentais de óperas e operatas românticas ainda de grande sucesso na época, num encontro pioneiro entre futebol e música. Comemorava-se, em junho de 1920, o triunfo dos alvinegros ribeirão-pretanos no Nordeste por ocasião da excursão ocorrida em abril daquele mesmo ano, quando o Comercial venceu os principais times locais, recebendo então o título de “Leão do Norte”. O próprio Belmácio atuou como ponta direita naquele time excepcional do Comercial, pois além de músico (flautista e compositor) era também jogador de futebol, tornando-se posteriormente ainda presidente do seu clube do coração.
Se estas fontes documentais (notícia de jornal) já nos indicam a existência do hino numa versão instrumental para banda sem letra desde 1920, contudo, esses manuscritos infelizmente ainda não foram localizados – se é que ainda existem. Já os manuscritos que citaremos agora (ver partitura em anexo), estão, por sirte, depositados na Biblioteca Central do Campus da USP de Ribeirão Preto. Os manuscritos autógrafos mais antigos que sobreviveram – ou seja, redigidos pelo próprio punho de Belmácio – não passam de esboços para piano sem indicação de data e sequer consta a letra. É provável que sejam da época da primeira gravação. Àquela altura (final dos anos 50 e início dos anos 60 do século passado), o professor Daniel Amaral Abreu (Ribeirão Preto, 1917 – 1978) escreveu a letra do hino. Há ainda, no entanto, uma partitura para piano manuscrita confeccionada posteriormente. Já ao ano de 1961 remonta a partitura sinfônica elaborada em manuscrito por Gilberto Gagliardi (São Paulo, 1922- Ribeirão Preto, 2001) e gravada pela Orquestra das Emissoras Associadas, sob regência do maestro Georges Henry (*Paris, 1919) – é esta gravação que ouvimos até hoje antes dos jogos e sempre ainda a mais difundida.
Por fim, numa entrevista ao jornal Destaque de São Paulo, a 15 de agosto de 1976, de Belmácio Pousa Godinho foi perguntado sobre suas obras, e declarou: “minhas composições que mais amo, amo de verdade, são Supremo Adeus e o Hino do Comercial, o Leão do Norte”.
Além de Belmácio Pousa Godinho, outros compositores históricos de Ribeirão Preto dedicaram obras musicais ao clube do coração e o mais querido da cidade, o Comercial Futebol Clube. Podemos citar o próprio José Delfino Machado, como também Maneco Silva (Ribeirão Preto, 1896-1964, violoncelista da OSRP), Edmundo Russomanno (Bragança Paulista, 1893 – Ribeirão Preto, 1963, também clarinetista e presidente da OSRP) e Angelino de Oliveira (Itaporanga, 1888 – São Paulo, 1964, autor da famosa Tristeza do Jeca, comercialino que acompanhava os jogos do comercial da Rua Tibiriçá nos anos 20), entre outros.
Para esta presente efeméride centenário do Comercial Futebol Clube (fundador a 11 de outubro de 1911), a OSRP está apresentando uma nova versão sinfônica por mim escrita para grande orquestra, mas respeitando os trabalhos anteriores e mantendo os fundamentos da brilhante partitura original de Belmácio P. Godinho, bem como da orquestração histórica de Gilberto Gagliardi.


 Rubens Russomanno Ricciardi
Professor Titular do Departamento de Música da FFCLRP-USP



Publicado na Revista Movimento Vivace – outubro / 2011


Clique para ver/ouvir:
Hino do Comercial pela OSRP regência Cláudio Cruz, orquestração Rubens Russomanno Ricciardi