“A OSRP nasceu de um punhado de homens idealistas, para afirmar de público que um monumento seria erigido nesta cidade, em homenagem à música. E esse movimento sintetizaria o símbolo da harmonia reinante no seio da classe musicista que, sem viver em dispersão, trabalharia em benefício da Arte Musical, difundindo pela sua orquestra sinfônica a boa música, no sentido do aprimoramento cultural do povo”. (parágrafo da primeira página do estatuto de funcionamento da Sociedade Musical de Ribeirão Preto 1938)
A história da OSRP está intimamente ligada a fatores políticos, econômicos e sociais do Brasil e do mundo. Compreendemos que questões como a imigração italiana em Ribeirão Preto e suas influências; a formação da aristocracia cafeeira e suas modificações nos hábitos sociais influenciados pela Belle Époque foram determinantes para a existência de sociedades sinfônicas desde a década de 1920. A inauguração da emissora de rádio local, em 1924, proporcionou a ampliação do movimento musical e seu consumo e muitos conjuntos musicais passaram a existir para suprir a necessidade da programação da rádio e das atividades musicais dos entretenimentos noturnos. As sociedades musicais desta época tinham a função de proporcionar a manifestação da música européia, agregando as pessoas de ricas classes sociais e os músicos, que geralmente não tinham esta profissão como a principal para o seu sustento, mas eram cúmplices, valorizavam e tinham por objetivo reproduzir uma parte do ambiente aristocrático que existia no Rio de Janeiro e São Paulo, que se espelhava nas realizações artísticas européias.
A economia de Ribeirão Preto, dependente do meio rural, teve na aristocracia seu domínio político que acompanhava a evolução do mundo moderno. O novo tempo, o “melhor” tempo, a modernidade e a tecnologia passaram a ser símbolo do viver aristocrático; são os interesses particulares que distinguem a classe economicamente dominante dos membros de outras classes.
O confronto das informações históricas sobre a OSRP e sobre as sociedades musicais - principalmente as cariocas - do final do século XIX e início do século XX também confirma a aristocracia como a principal patrocinadora das atividades sinfônicas, assim como aconteceu em Ribeirão Preto através da OSRP. A organização dos sócios, na grande maioria das sociedades, era a mesma empregada até hoje na OSRP, como demonstrada desde seu primeiro estatuto de funcionamento: sócios beneméritos - que contribuem com valores significativos em dinheiro, são considerados patronos e não pagam taxas; sócios honorários - músicos profissionais ou fundadores da instituição, que também não pagavam taxas; sócios contribuintes - que contribuem com parcelas mensais e sócios participativos - geralmente músicos amadores ou outro funcionário da Sociedade.
Também dentro das distinções acima, averiguamos que a OSRP existe e sempre foi mantida pelo seu significado social: representa a aristocracia e a condiciona dentro do seu poder simbólico. É instrumento de legitimação da sua sociedade, uma vez que proporciona a música de qualidade, a erudita, e coloca, por meio de seus concertos, separações entre os que dela fazem parte e os que não estão inclusos entre músicos, funcionários e sócios, sendo estes os detentores da cultura da elite, pertencendo ou não ao mesmo nível financeiro e social.
Pelo controle da opinião sobre o que é a música de qualidade, das participações dos concertos ou o simples fato de ser sócio, apesar de não participar ativamente da movimentação da Sociedade Musical, é exercida a dominação dos intelectuais sobre os que não têm acesso ao conhecimento, dos ricos sobre os pobres, dos mais sobre os menos favorecidos. Este significado expressa a legitimação pelo conhecimento, um disfarce empregado em hábitos durante a prática dos concertos, nos quais se reitera a apropriação do bem simbólico “orquestra”, impondo-a.
Para o início das atividades da OSRP, em 1938, e sua continuação, muitos trabalharam e literalmente pagaram para que a sua existência fosse efetiva, mas dois nomes são evidenciados pela figura de liderança, administrativa e musical, respectivamente: Max Bartsch e Ignázio Stábile, liderança esta também exercida nas atividades musicais da cidade anteriores à formação da Sociedade Musical de Ribeirão Preto, mantenedora da OSRP.
Gisele Haddad
arquivohistorico@osrp.org.br
Publicado na Revista Movimento Vivace Ano III nº 27 Setembro de 2010.